Meu pai é minha alma gêmea

Há alguns anos, escrevi o seguinte texto para o meu pai:

“É impressionante como somos parecidos, tanto que até assusta um pouco. Mas isso é muito bom, porque ele tem qualidades únicas e valores que são muito difíceis de se encontrar hoje em dia. Como todas as pessoas, meu pai tem seus defeitos, mas ele tem uma qualidade marcante que o distingue da maioria das pessoas: sua incrível capacidade de se doar para nos ver felizes. Ele faz de tudo por nós, desde sair em noites frias para ir à farmácia, até viajar 800 km em um dia, deixando tudo de lado, apenas para me levar à casa de uma prima. Jamais me esquecerei desse dia.

Meu pai não é uma pessoa que deixa transparecer facilmente seus sentimentos, porém, ele tem três olhares muito distintos: um olhar é de orgulho. Ele olha para os filhos de uma forma tão orgulhosa que nos deixa até um pouco constrangidos. Quando vai contar a alguém algo admirável, seus olhos brilham tanto que acabam falando mais do que as palavras. Outro olhar é de repreensão. Quando ele está bravo, seu olhar é tão duro que parece uma faca perfurando o coração. Um olhar que pode doer mais que uma surra e machucar mais do que mil palavras. O terceiro é o olhar manso, distante, quando ele parece estar em outro mundo. Um mundo só dele, impenetrável, onde ele leva suas ideias para passear.

O fato de sermos tão parecidos muitas vezes nos aproximou, porém, algumas vezes nos afastou. Hoje estamos geograficamente longe um do outro. Sinto falta do seu jeito carinhoso, do seu perfume que enche o ambiente, de conversar sobre coisas sérias, dos seus olhares… Amo o meu pai e espero que seus olhos estejam sempre, mansamente, guiando meus caminhos pela vida.” (Nathalie, 24 de março de 2006)

Quando escrevi esse pequeno texto, a mãe de uma amiga muito querida me disse: “Que maravilha que você teve a oportunidade de declarar seu amor ao seu pai em vida. Quisera eu ter tido essa chance.” Agradeço a Deus por ter tido um pai que eu pude amar, enquanto tantas pessoas têm problemas com seus pais e chegam ao ponto de romper o relacionamento.

Tenho a alegria de ter presenciado o papai olhando para o meu filho com o mesmo grande amor com que sempre olhou para nós. Era comum vê-lo comentar: “meu neto é muito inteligente… é o primeiro da classe… eu ensino uma vez só e ele já aprende…” entre tantas outras frases que mostravam o quanto ele o amava e se orgulhava dele.

De tantos ensinamentos deixados por meu pai, um dos mais importantes foi estar sempre com os olhos fixos na eternidade. Dessa forma, ele mostrou, com sua vida, o que era ter fé verdadeira, não importando as circunstâncias, e que a sua esperança estava em Cristo e não nas coisas desse mundo. Que herança linda ele nos deixou!

Algum tempo depois que o papai partiu, estávamos, em família, vendo as últimas mensagens que trocamos pelo WhatsApp e descobrimos que eu fui a última pessoa a falar com ele, antes dele ir para a UTI. Que conforto saber que estivemos juntos até o fim. Que bênção e que privilégio saber que seus olhos nunca se afastaram de mim e que, um dia, estaremos juntos de novo, face a face, contemplando nosso Salvador.

Que saudade do meu pai, dos seus olhos… onze meses sem a minha alma gêmea…

Nathalie, 15/04/2021.

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